Confira a edição de junho de 2024 do Boletim de Jurisprudência, elaborado pelo nosso time de Reestruturação.
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PROCESSO 01
Dados do Processo
REsp 1.503.485-CE, Rel. Ministro Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 4/6/2024.
Destaque
A Quarta Turma do STJ decidiu que, mesmo prescrita a pretensão de cobrança de uma dívida civil, o credor pode buscar a satisfação do seu crédito por outro instrumento jurídico-processual cujo exercício ainda não tenha sido atingido pela prescrição.
Ementa
Civil e processual civil. Alienação fiduciária de bem móvel. Satisfação do crédito. Múltiplos instrumentos. Processuais. Possibilidade. Extinção da pretensão de cobrança. Busca e apreensão. Prescrição simultânea. Não ocorrência. Obrigação pecuniária. Subsistência. Credor fiduciário. Propriedade resolúvel. Direitos inerentes.
1. O exame sobre a ocorrência do fenômeno prescricional deve ser realizado de modo estanque, à luz dos pedidos formulados na petição inicial, e não se contamina pelo objetivo último do autor da demanda – no caso, a recuperação do crédito inadimplido por meio distinto da ação de cobrança.
1.1. De fato, a busca pela satisfação de um crédito pode ser feita por meio de instrumentos processuais diversos, cada um deles sujeito a prazo prescricional específico.
1.2. Se prescrita a pretensão de cobrança de dívida civil, todavia existindo no ordenamento outro instrumento jurídico-processual com equivalente resultado, cujo exercício não tenha sido atingido pelo fenômeno prescricional, descabe subtrair do credor o direito à perseguição de seu crédito por qualquer outro meio, sob pena de estender os efeitos da prescrição para o próprio direito subjetivo.
1.3. No caso sob exame, o pedido é de busca e apreensão de bens alienados fiduciariamente, e como tal deve ser analisado. Segundo o art. 3º, § 8º, do Decreto-Lei n. 911/1969, a busca e apreensão prevista no dispositivo constitui processo autônomo e independente de qualquer procedimento posterior. Inaplicável, dessarte, a regra do art. 206, § 5º, I, do CC/2002, visto não se tratar, este caso, de demanda que visa à “cobrança de dívidas líquidas constantes de instrumento público ou particular”.
2. Na alienação fiduciária, a propriedade da coisa é transmitida ao credor, que outrossim se investe na posse indireta do bem. Em caso de descumprimento das obrigações contratuais, pode o fiduciário optar pelo ajuizamento de ação de cobrança – ou de execução, se aparelhado de título executivo – ou, à sua escolha, a busca e apreensão do bem dado em garantia. Nessa última hipótese, assim o faz na qualidade de proprietário, exercendo uma das prerrogativas que lhe outorga o art. 1.228 da lei civil, qual seja “o direito de reavê-la [a coisa] do poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha”.
3. Diversamente do que ocorre no campo tributário (CTN, art. 156, V), na esfera civil a prescrição nem sequer implica extinção da obrigação – não constitui, efetivamente, qualquer das hipóteses previstas no Título I, Livro I, da Parte Especial do CC/2002 (arts. 304 e ss.). Somente a pretensão é fulminada (CC/2002, art. 189), subsistindo a obrigação.
3.1. À míngua de restar extinta a obrigação, não há falar na aplicação da norma prevista nos arts. 1.367 c.c. 1436, I, do CC/2002.
4. O conhecimento do recurso pela alínea “c” do permissivo constitucional exige a demonstração da divergência mediante o cotejo analítico do acórdão recorrido e dos arestos paradigmas, de modo a se verificarem as circunstâncias que assemelhem ou identifiquem os casos confrontados (arts. 255, § 1º, do RISTJ e 1.029, § 1º, do CPC/2015), ônus do qual a parte recorrente não se desincumbiu.
5. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, desprovido.
PROCESSO 02
Dados do Processo
ProAfR no REsp 1.874.133-SP, Rel. Min. João Otávio de Noronha, Segunda Seção, por unanimidade, julgado em 18/6/2024, DJe 21/06/2024. (Tema 1266).
ProAfR no REsp 1.883.871-SP, Rel. Min. João Otávio de Noronha, Segunda Seção, por unanimidade, julgado em 18/6/2024, DJe 21/06/2024 (Tema 1266).
Destaque
A Segunda Seção resolveu afetar o Resp 1.874.133-SP e REsp 1.883.871-SP ao rito dos repetitivos para uniformizar o entendimento a respeito da possibilidade de penhorar imóvel alienado fiduciariamente em razão de débito condominial, sem suspender a tramitação de processos.
Ementa (ProAfR no RECURSO ESPECIAL Nº 1.874.133 – SP):
Proposta de afetação. Recurso especial representativo de controvérsia. Direito civil e processual civil. Execução de despesas condominiais. Alienação fiduciária. Penhora do imóvel.
1. Delimitação da controvérsia: Definir se é possível penhorar o imóvel alienado fiduciariamente em decorrência de dívida condominial.
2. Afetação do recurso especial ao rito previsto nos arts. 1.036 e 1.037 do CPC de 2015 e 256 ao 256-X do RISTJ.
PROCESSO 03
Dados do Processo
ProAfR no REsp 2.093.929-MG, Rel. Ministro Antonio Carlos Ferreira, Segunda Seção, por maioria, julgado em 21/5/2024, DJe 04/6/2024. (Tema 1261).
ProAfR no REsp 2.105.326-SP, Rel. Ministro Antonio Carlos Ferreira, Segunda Seção, por maioria, julgado em 21/05/2024, DJe 04/06/2024 (Tema 1261).
Destaque
A Segunda Seção acolheu a proposta de afetação do REsp 2.093.929-MG e REsp 2.105.326-SP ao rito dos repetitivos para uniformização do entendimento a respeito da possibilidade de penhorar bem de família dado em garantia real, com a suspensão do processamento de todos os processos pendentes.
Ementa (ProAfR no REsp 2105326 / SP):
Proposta de afetação. Rito dos recursos especiais repetitivos. Direito civil e processual civil. Bem de família. Exceção à regra da impenhorabilidade. Imóvel dado em garantia real pelo casal ou pela entidade familiar. Art. 3º, v, da lei n. 8.009/1990. Multiplicidade de recursos. Dispersão jurisprudencial nas instâncias ordinárias.
1. Controvérsia relativa à possibilidade de o bem de família dado em garantia real pelo casal ou pela entidade familiar ser penhorado.
2. Nos termos do art. 3º, V, da Lei n. 8.009/1990, a impenhorabilidade do bem de família é oponível em qualquer processo de execução civil, fiscal, previdenciária, trabalhista ou de outra natureza, salvo se movido para execução de hipoteca sobre o imóvel oferecido como garantia real pelo casal ou pela entidade familiar.
3. A jurisprudência do STJ, ao interpretar tal exceção à impenhorabilidade, orientou-se no sentido de que se cuida de hipótese de renúncia à proteção legal, mas restringe sua abrangência somente para aqueles casos em que a dívida foi constituída em benefício da entidade familiar, avançando para distribuir o ônus da prova da seguinte forma: (i) se o bem foi dado em garantia real por um dos sócios de pessoa jurídica, é, em regra, impenhorável, cabendo ao credor o ônus de comprovar que o débito da pessoa jurídica se reverteu em benefício da entidade familiar; e (ii) caso os únicos sócios da sociedade sejam os titulares do imóvel hipotecado, a regra é da penhorabilidade do bem de família, competindo aos proprietários demonstrar que o débito da pessoa jurídica não se reverteu em benefício da entidade familiar.
4. No entanto, malgrado o STJ tenha fixado orientação jurisprudencial uniforme, tem-se verificado significativa dispersão jurisprudencial acerca da matéria, com adoção de distintas interpretações pelos Tribunais ordinários, o que tem conduzido à multiplicidade de recursos nesta Corte Superior.
5. Caso concreto em que o Tribunal de origem autorizou a penhora do bem de família dado em garantia real pelo sócio da sociedade empresária e único proprietário do imóvel, presumindo o proveito da entidade familiar pelo simples fato de a esposa do proprietário integrar a sociedade empresária.
6. Questão federal afetada: (i) necessidade de comprovação de que o proveito se reverteu em favor da entidade familiar na hipótese de penhora de imóvel residencial oferecido como garantia real, em favor de terceiros, pelo casal ou pela entidade familiar nos termos do art. 3º, V, da Lei n. 8.009/1990; e (ii) distribuição do ônus da prova nas hipóteses de garantias prestadas em favor de sociedade na qual os proprietários do bem têm participação societária.
7. Recurso especial afetado ao rito dos recursos repetitivos, com determinação de sobrestamento de recursos especiais e agravos nos próprios autos, nos termos do art. 1.037, II, do CPC/2015.